quarta-feira, 26 de julho de 2017

Cervejas artesanais: das caseiras do Leonardo Soares às microcervejarias

Aquallungi, uma autêntica cerveja artesanal Belgian Tripel, do Leonardo Soares

Uma pausa hoje para explicar alguns conceitos que tenho utilizado que podem confundir um pouco.

Basicamente, o foco deste blog são cervejas artesanais e assuntos correlatos. Mas o que viria a ser cervejas artesanais? O que quero dizer como isso? Quais seriam os preceitos fundamentais para que eu denominasse uma ou outra cerveja como artesanal?

Capa do Livro citado de Steve Hindy
Bem, vamos com calma. Há uma série de definições, uma mais restritivas e outras mais abrangentes, mas para efeito do presente blog, pretendo adotar a definição de que cervejas artesanais são aquelas cujo cervejeiro é o responsável direto pela receita e pelo seu estilo. Não está lá apenas cumprindo uma determinação externa, provenientes de uma estrutura hierárquica. Para ir mais longe, podemos ainda citar a definição utilizada por Steve Hindy |(autor do livro Revolução da Cerveja Artesanal) de que as cervejarias artesanais devem manter-se pequenas, "ser independentes e todas as cervejas devem ser de malte (em lugar de aditivos de arroz e milho usados pelas grandes cervejarias)" [1]. Nesse sentido, cervejarias que iniciaram independentes, mas foram adquiridas por alguma grande corporação, como a Eisenbahn ou a Wals, não considero como artesanais.

Isto posto, temos um grande universo de cervejeiros artesanais. Entretanto, há diferenças nesse meio. Basicamente podemos dividir as artesanais em dois grandes grupos: os cervejeiros caseiros e as microcervejarias. Essa divisão aqui adotada não tem a pretensão de ser uma linha definitiva e instransponível, nem tampouco considero a única conceituação aceitavel. A transformação de um cervejeiro caseiro em microcervejaria pode ocorrer de forma gradual. Muitas das que tenho citado aqui encontram-se no meio do caminho entre caseiras e microcervejarias. 

Os cervejeiros caseiros são aqueles que fazem cerveja em suas próprias residências, com pouco espaço, investimento menor ainda e muita (mais muita mesmo) criatividade. Fundamentalmente são amadores, ou seja, possuem uma outra atividade profissional e tem, na brassagem, muito mais um hobby, ainda que levado cada vez mais a sério. Trata-se de um grupo que tem crescido exponencialmente e está sempre em busca de ampliar seus conhecimentos, fazer cursos, se aprimorar.

Um exemplo clássico de cervejeiro caseiro em Curitiba é Leonardo Soares. Geólogo da Intertechne, descobriu em outubro de 2011 que era possível fazer cerveja em casa quando conheceu a Hop'n Roll. Desde então, comprou o equipamento necessário, fez as devidas adaptações e resolveu transformar a garagem do sobrado onde reside em sua própria cervejaria. Em 2015, quando eu comecei a me interessar em fazer cerveja em casa, tive a oportunidade de acompanha-lo na brassagem de uma Belgian Tripel, batizada de Aquallungi. Cerveja, aliás, que ficou muito boa, com aroma cítrico e bem equilibrada.

A estrutura que ele preparou me surpreendeu: em um pequeno espaço organizou tudo meticulosamente, e apresentava uma disposição perfeita de cada equipamento. Como cereja do bolo, a receita copiada em giz na parede pintada com tinta de lousa. Nos fundos da casa, uma velha geladeira adaptada para ser o fermentador.

Leonardo Soares (camiseta branca) em sua cervejaria na própria garagem
Tal como outros caseiros, Léo tem sempre procurado se aperfeiçoar fazendo cursos e se capacitando também para julgar cervejas (já obteve certificado da BJCP). Enfim, é um estudioso do tema. Sua produção acaba sendo mais para seu próprio consumo, além de repassar a amigos. Até hoje já foram 52 levas de cervas, além de um hidromel. 

Como bom cervejeiro caseiro, tem sempre um toque de irreverência. Quando sua primeira filha nasceu, ele fez uma baltic porter que transformou em lembrancinha para quem visitassem a filha, com as garrafas batizadas com o nome dela e uma pintura de aquarela feita por sua esposa no rótulo.

Desde então, ganhou o primeiro prêmio com uma tripel, obteve um 3°lugar nas belgas em 2015 e o outro em 2016 com uma strong bitter inglesa, primeiro lugar na categoria e 3° no best of show, ambos concursos paranaenses

Em termos de organização, muitos desses cervejeiros caseiros são associados à Acerva, no caso do Paraná, Acerva-PR, que serve como uma espécie de rede de cervejeiros e contribui para que comprem insumos em consumo, obtendo melhores preços. Além disso, sempre se encontram em diferentes cursos ou concursos.

Já as microcervejarias são aquelas já mais estruturadas, com um investimento bem maior e seus responsáveis são profissionais dessa atividade. Vivem de fazer cerveja. Essas microcervejarias são detentoras de rótulos já disponíveis em mercados (já conseguiram registro no MAPA) e conseguem atingir um público maior até mesmo fora de suas sedes. Acabam tendo um papel importante na divulgação de cervejas artesanais. Em Curitiba e região há um grande universo dessas microcervejarias, tais como a Bodebrown, Way, Bier Hoff, Dum, Klein, etc.

Obviamente não estou aqui fazendo um tratado e essas definições tem pura e simplesmente um caráter didático, sujeito a questionamentos. Como sociólogo, não me sentiria à vontade em continuar escrevendo sobre um tema tão fascinante, sem conceituá-lo minimamente. O que importa aqui é que tanto os cervejeiros caseiros como as microcervejarias mais estruturadas, podem se enquadrar como cervejas artesanais no meu conceito adotado e, juntas, fazem parte de revolução em curso. 

Um brinde a todos artesanais que aqui se enquadram.



Nota:  [1] HINDY, Steve. A Revolução da Cerveja Artesanal, ed. Tapioca, 2014.





sábado, 15 de julho de 2017

Revolucionários artesanais: Julio Rossi e sua Volante Birra



Volante Birra [1]

Em abril desse ano, estive em um evento noturno na Sapatilha Colorida, moderna loja de calçados situada no Alto da Glória, e me deparei com uma bela kombi retrô estacionada na frente, que trouxe cervejas artesanais. Tratava-se da Volante Birra (clique aqui para mais informações)

Torneiras da Volante Birra no evento
Para dar conta da diversidade de público, havia cinco opções de estilos e marcas de cervejas artesanais distintas do Paraná:

  • Pilsen, da Nashville
  • Weiss, da Oner
  • Apa, da Insana
  • Dry Stout, da Oner; e
  • IPA (não me recordo o nome da microcervejaria).
Julio Rossim [1]


Seu proprietário é Julio Rossi, roqueiro, tricolor carioca e apaixonado por cachorros, é também um grande apreciador de cervejas. Fotógrafo e músico, ele começou a pesquisar e testar as primeiras receitas de cerveja no começo de 2015. Toda a facilidade que se tem hoje de encontrar equipamentos e insumos acabou ajudando-o a ingressar nesse meio. Fez um curso básico de produção de cerveja com extrato e ingressou de vez no meio cervejeiro.

No final de 2015, realizou um antigo sonho e adquiriu uma kombi antiga. Após 8  meses reformando-a, acabou deixando nos trinques e transformou-a na Volante Birra, um loja móvel que junta duas paixões: a cerveja artesanal e kombi antiga.A sua ideia com a Volante Birra é participar de eventos em diferentes lugares e divulgar cervejas artesanais de estilos diferenciados para um público ainda não tão familiarizado em muitos casos. Com isso, acabou se transformando em mais um personagem do mundo cervejeiro de Curitiba e região.

A Volante Birra busca equilibrar o gosto de seus cervejeiros com o do publico em geral conforme o evento, mas se tem uma cerveja que faz questão de disponibilizar é uma boa American IPA. Em algumas ocasiões, a Volante Birra já chegou a engatar cervejas de produção própria chamada Tropicália (nome muito feliz, por sinal). Tendo o cuidado de não avisar o público (para não influenciar nas opiniões) Júlio percebeu que as reações foram muito positivas. Como ele e seus parceiros gostam do ritual das panelas, isso acabou servindo como bom pretexto para juntar a galera e beber enquanto fazem diferentes variações de IPAs, ainda que a produção, por ora, se resuma a uma receita por mês.
Volante Birra em evento [1]

Nesse processo de produzir IPAs, tem uma história interessante. Após experimentar uma West Coast IPA (estilo que se caracteriza pelo uso excessivo de lúpulo em microcervejarias da costa oeste dos EUA), passou a ter como objetivo criar alguma receita que se aproximasse desse estilo. Em uma brassagem sem compromisso com um amigo, se distraíram e erraram feio a quantidade de água da receita. Mas para não desperdiçar, resolveram pagar pra ver e, depois de um tempo maturando, experimentaram e perceberam que tinha ficado muito boa, embora diferente do que se pretendia. Estudaram um pouco, fizeram testes e chegaram à conclusão que a pretensa West Coast IPA tinha se transformado uma excelente Session IPA (uma IPA mais leve, menos alcoólica e com menor amargor), cerveja da Tropicália com melhor retorno do público. Isso enfatiza um aspecto divertido do de cervejeiros caseiros: por não estarem preso a regras, é possível experimentar e errar bastante cada receita.

Júlio é um otimista em relação à revolução da cerveja artesanal em curso. Como consumidor, percebe que cada vez há maior disponibilidade de cervejas de diferentes rótulos e estilos. Abrem-se novos bares e criam-se novas cervejas de qualidade, ampliando o público interessado que cada vez mais migra das insonsas cervejas industrializadas feitas com milho para as cervejas artesanais. E como esse mercado tem-se ampliando, como distribuidor de cerveja ao melhor estilo retrô que caracteriza sua kombi, ele continua muito animado.

Que a Volante Birra continue rodando muitos quilômetros para difundir ainda mais a cultura cervejeira.


Nota [1]: as fotos dessa nota  foram obtidas na página do Facebook da Volante Birra (https://www.facebook.com/volantebirramobile/)






terça-feira, 4 de julho de 2017

Revolucionários Artesanais - Henrique Cruz "Giraia"

Henrique Cruz "Giraia", na brassagem

Hoje começaremos aqui a série Revolucionários Artesanais, que apresentará perfis de cervejeiros que têm desenvolvido um trabalho importante na divulgação da cerveja artesanal de diversas formas.

Há cerca de três meses, curioso a respeito dos concursos cervejeiros e incentivado pelo amigo cervejeiro já premiado Leonardo Soares, acabei me inscrevendo em um grupo de estudos para avaliar cervejas pelo Guia Beer Judge Certification Program - BJCP. Trata-se de uma galera que realiza encontros quinzenais para degustar de 7 a 10 cervejas de diferentes estilos visando preencher a súmula da BJCP e, em seguida. compartilhar as impressões e avaliações. Além de aprimorar a percepção em relação a cada estilo, serve para aprendermos mais ainda sobre suas características e nos atualizarmos com o Guia 2015. Esse grupo começou se reunindo na Masmorra e, posteriormente, migrou para a Mr. Hoppy.

E quem organiza isso tudo, correndo atrás das cervas, reservando espaço, juntando a grana da galera para compras, tirando cópias das súmulas, etc? É o Henrique Cruz, conhecido como Giraia, cervejeiro, juiz BJCP e figura cada vez mais conhecida no meio.

Grupo de Estudo para juízes da BJCP, organizado pelo Giraia

Certamente por trás disso, tem uma motivação muito particular. No caso do Giraia, o interesse por cervejas especiais e artesanais  começou entre 2006/07, quando foi fazer um intercâmbio na Bélgica por um programa do Rotary e conheceu de perto uma das principais escolas cervejeiras do mundo. Anos depois, já de volta à Curitiba, formado como tecnólogo em jogos digitais, passou a realizar diversos cursos na área cervejeira, a começar pelo já reconhecido curso de produção de cerveja na panela na Bodebrown em 2013 e o de Sommelier de Cervejas da Universidade Positivo (onde atualmente leciona). Depois disso, fez ainda diversos cursos pontuais, com destaque para a Pós graduação em Gestão e Tecnologia Cervejeira.

As duas cervejas da Hump já lançadas
E junto com o interesse, foi crescendo sua efetiva participação na divulgação do movimento cervejeiro. Em 2016, durante  o South Beer Cup, motivado por Fernanda Lazari da Morada Cia. Etílica (microcervejaria de Curitiba),  participou de uma competição de plano de negócio de cervejas. Foi quando surgiu a ideia de desenvolver a marca Hump, cujo nome decorre de histórias que escutava de Guilherme Comineze durante a pós em relação a um amigo de seu pai que criava camelos em Curitiba (isso mesmo!). Com o segundo lugar obtido na competição, Giraia se motivou ainda mais, contratou um designer e levou o projeto da Hump em frente até que em abril conseguiu lançar dois estilos: American Pilsner e American Pale Ale através de uma parceria com o Clube do Malte. Eu mesmo tive a oportunidade de degusta-la na Masmorra a versão no barril e gostei muito. O objetivo dele agora é finalizar questões legais e de investimento para regularizar o processo de produção e distribuição.

Paralelamente ao seu gosto por fazer cervejas, surgiu o interesse em julgá-las e, consequentemente, o interesse em se aprofundar na BJCP. Em 2015, quando  mandou amostras de suas cervejas caseiras pela primeira vez, passou a estudar para avaliar as cervejas e desde então, sempre que pode tem participado de concursos. Aprofundou seus conhecimentos, passou na prova da BJCP e começou a atuar também como juiz. Por ora, como Certfied (com 78 pontos), mas aguardando novos resultados, acredita passar logo dos 80 pontos, visando se preparar para a prova de NationalUma dificuldade para ampliar não só a sua participação, mas a de outros juízes bem qualificados é o aspecto amador, que faz com que cada um tenha sempre que arcar com os custos dessas participações, sem que os concursos banquem sequer hospedagem ou transporte, algo que já ajudaria muito.

Foi a partir desse seu comprometimento com concursos e com a melhoria de julgamentos que resolveu incentivar a formação de novos juízes através da criação de grupos de estudo (como esse que estou participando) ou até mesmo constituindo cursos específicos. 

Logo da Confrades
Com o perfil dinâmico característico dos protagonistas do cenário cervejeiro, em meados de 2016, quando seu colega (e agora sócio) LG o procurou apara promover um evento cervejeiro, surgiu a ideia de constituir a Confrades Beer Club.

Depois de um tempo moldando o projeto, agora - na metade de 2017 - a Confrades está saindo do papel. O objetivo da Confrades é ser uma espécie de hub cervejeiro, interligando a rede cervejeiras e realizando eventos como, por exemplo, atendimento a eventos in company , cuja demanda é cada vez maior.

Sob a cabeça criativa de Henrique Cruz, a ideia é criar uma espécie de clube, com uma anuidade para quem quiser ser membro e obter vantagens como descontos em estabelecimentos cervejeiros parceiros, além de oferecer uma vasta quantidade de cursos de diversas duração para todos os públicos, sempre focados no universo das cervejas. De fato, hoje há uma lacuna em relação a esses cursos básicos, já que o mercado oferece apenas algo mais específico, como curso de sommelier, que leva 40-50h aula.

Ou seja, temos no Giraia um personagem que joga nas onze: faz cerveja, julga a qualidade, dá cursos e organiza eventos no cenário cervejeiro. Que toda essa energia do Giraia contribua ainda mais para canalizar forças em torno da verdadeira revolução das cervejas artesanais em curso.  


Nota: todas as fotos foram obtidas na página do facebook do Henrique Cruz:
https://www.facebook.com/giraiacruz/photos_albums?lst=1157563379%3A100000608827247%3A1499220426


domingo, 11 de junho de 2017


Um bom termômetro para se ter a dimensão da importância das cervejas artesanais é o número de eventos, cada vez mais frequentes, relacionados diretamente às cerva caseiras ou provenientes de microcervejarias.

Só nesse final de semana, em Curitiba e região, tivemos dois: 

Entre os dias 7 e 10 (sábado), ocorreu em Colombo o Cout Beer Festival, que segundo cartaz de divulgação, seria a festa caipira mais rock'n'roll de todos os tempos. Um dos destaques desse festival seriam cervejas artesanais. Infelizmente não pude comparecer.

Hoje, dia 11/6, está ocorrendo a 3ª edição da EQ Beer Festival. no Pedrão Lounge Bar (perto do Centro Politécnico). O foco desse evento é dissemir a cultura cervejeira de oito grandes cervejeiros de engenharia química. E contará ainda com apoio da galera da Rádio Treze. Vale a pena averiguar. Eu vou checar!

Em Campinas, ontem, a Toca da Mangava lançou a Fly me to the Moon, uma Barleywine produzida especial para o inverno. Relatos de quem esteve lá confirmam que vale muito a pena conhecer. 

Com a correria do dia-a-dia, acabei não divulgando a tempo. Mas a ideia é reestruturar o blog para que sirva também de agenda em uma aba específica. Aguardem que em breve teremos mudança por aqui. 


segunda-feira, 5 de junho de 2017

Dia da Cerveja Brasileira



Dia 5 de junho é o Dia da Cerveja Brasileira. Esse dia foi escolhido em 2012, para celebrar Ruprecht Loeffler, conhecido como "Seu Lefra", falecido em 2011 aos 93 anos, da Cervejaria Canoinhense.

Trata-se da cervejaria artesanal considerada a mais antiga do Brasil. Fundada em 1910, em 1924 foi adquirida por Otto Loeffler e desde 1939 passou a ser administrada por Ruprecht, seu filho, a Cervejaria Canoinhense teve sua história retratada nesse curta. Vale a pena conferir para celebrar o Dia da Cerveja Brasileira.





Direção: Demétrio Panarotto, Guto Lima, Luiz Henrique Cudo
Sinopse Curta-Metragem: 
Rupprecht Loeffler foi um senhor de 93 anos de idade. Sua profissão? Mestre cervejeiro. Ele e sua cervejaria, a "Canoinhense" são os personagens deste documentário. 
Prêmios e Festivais:
Prêmio Cinemateca Catarinense/Fundação Catarinense de Cultura de 2008
Faial Filmes Fest 2010 – Festival de Curtas das Ilhas (Azores Short Film Festival)
17º Vitória Cine Vídeo
Curta Cinemateca Especial - Cinemateca Brasileira

sábado, 3 de junho de 2017

Cerveja é filme!

Michael Jackson, o caçador de cerveja (não confundir com outro) [1]

Para quem tem alguma dúvida de que cervejas artesanais estão realizando uma verdadeira revolução, basta observar como esse tema tem sido cada vez mais retratado em filmes e documentários.


Provavelmente o marco nesse processo tenha sido o The Beer Hunter (O caçador de cerveja) que Michael Jackson fez em 1989 para o Discovery Channel. Obviamente não estamos falando aqui do rei do pop mundial, mas sim outro, inglês, ícone do mundo cervejeiro. Autor de diversos livros sobre cerveja, a começar com o best-seller (nunca traduzido em português) The World Guide to Beer, o primeiro guia que abordou o tema, publicado em 1977, Michael Jackson viajou o mundo atrás de segredos de cervejas e acabou desempenhando um papel fundamental para a valorização de diversos estilos e de cervejas locais.  

The Beer Hunter, disponível inclusive legendado no YouTube  (www.youtube.com/watch?v=IvAsgugPbCE&t=946s), possui seis episódios, cada um abordando as particularidades de cervejas de alguma região do mundo. No primeiro, em visita à Bélgica, apresenta o universo das Lambics, cervejas de fermentação espontânea. No segundo, ele explora a tradição cervejeira da Baviera, na Alemanha. No terceiro, ele explora o país com maior consumo per capita de cerveja do mundo: a República Tcheca (na época ainda como Tchecoslováquia), onde desvenda, entre outros segredos, a tradicional fábrica da Pilsner Urquell. No quarto visita o Monastério de Koningshoeven, único produtor de cervejas Trapistas situada na Holanda. No quinto episódio, Michael Jackson cruza o Atlántico e vai para a Califórnia, investigar a Anchoer Steam, verdadeira jóia rara das cervejarias artesanais. E no último episódio, ele retorna à Inglaterra para o evento anual que serviu de inspiração para o renascimento das tradicionais real ales ingleses. 

Embora seja um documentário com quase 30 anos, acabou desempenhando um papel fundamental para a valorização da cultura cervejeira. Falecido em 2007, dois anos antes do ídolo da música pop, Michael Jackson (o cervejeiro) foi certamente umas das figuras mais marcantes da história do mundo das cervejas.

Para não ficar atrás, a National Geographic também resolveu investir em documentários sobre cerveja, mas optou pelo caminho oposto: optou por documentar duas gigantes do mundo em uma série chamada “Megafactories”: a irlandesa Guinness e a holandesa Heineken. Sem ser tão interessante como a série com Michael Jackson, o documentário da National Geographic acaba apelando para cervejas mais comerciais (www.dailymotion.com/video/xs8bod_national-geographic-megafactories-heineken_tech).

Cartaz de "Como a Cerveja Salvou o Mundo" [2]
Outro documentário interessante e bem-humorado é “Como a Cerveja Salvou o Mundo” (www.youtube.com/watch?v=xO53rQ9nqQs), produzido pela Discovery Channel também. O filme faz uma viagem pela história da humanidade para demonstrar que, em vários momentos, a cerveja desempenhou um papel fundamental. O primeiro feito da cerveja foi dar condições para que os humanos se fixassem em algum local, já que o objetivo da revolução agrícola que permitiu que se cultivasse grãos como a cevada seria a produção da cerveja e não o pão. O pão que seria uma cerveja sólida (e não o contrário como dizem por aí). Em seguida, são relatadas a influência direta da cerveja em outros momentos cruciais, como a escrita (uma forma para perpetuar receitas de cervejas), a substituição da água infectada durante a idade média, o processo de pasteurização, a refrigeração e até mesmo a indústria moderna, entre outros. Exagero ou não, o fato é que o documentário, além de entreter, serve como ótima justificativa para que a gente continue a louvar a cerveja nossa de cada dia.

Recentemente, a Netflix disponibilizou em seu cardápio, no meio de séries e filmes que chamam atenção do grande público, “Novos Mestres Cervejeiros” (do original em inglês “Crafting a Nation”), que aborda o universo e os bastidores de cervejeiros artesanais em diferentes cidades dos EUA, documentário esse que já foi abordado no Revolução Artesanal.

Um dos muitos casos relatados nesse documentário refere-se à cervejaria Schlafly, que em 1991 teve a audácia (digamos assim) de se estabelecer em Saint Louis (Missouri), cidade que serviu de porta de entrada do meio-oeste americano, onde funciona a sede mundial da Budweiser (hoje Anheuser-Busch InBev – AB InBev, a gigante do setor de dispensa apresentações).

Por trás desse confronto Schlafly x Anheuser-Busch InBev, podemos identificar uma verdadeira guerra em curso entre as microcervejarias e a grande indústria cervejeira. Esse cenário é bem retratado também no documentário “Beer Wars”, dirigido por Anat Baron, que apresenta provas de ação de lobistas para prejudicar as cervejarias artesanais. Embora se passe nos EUA, certamente retrata questões muito familiares ao universo cervejeiro local.

No Brasil, particularmente, o caso da histórica cerveja Canoinhense, talvez uma das artesanais há mais tempo no mercado foi objeto do curta “Cerveja Falada” (www.youtube.com/watch?v=YaNWFGVns60), que relata a história de Rupprecht Loeffler (conhecido como "Seu" Lefla), mestre cervejeiro com 93 anos de idade na época do documentário. Uma verdadeira viagem no tempo que merece uma postagem especial assim que eu experimentar suas cervejas como “Nó de Pinho” ou “Jahu”.
Cartaz do Curta "Cerveja Falada" [3]

Por fim, esses documentários trazem histórias de vida que podem servir de inspiração para cervejeiros caseiros seguirem em frente. Parafraseando a canção do Cordel do Fogo Encantado que serviu de tema para o filme “Lisbela e o Prisioneiro”, cerveja é filme (....eu sei pelo cheiro de malte e lúpulo que dá quando a gente toma).

Notas:
[1] Imagem acessada em http://philly.thedrinknation.com/articles/read/6614-Kick-in-a-Few-Bucks-for-the-Michael-Jackson-Beer-Hunter-Movie
[2] Imagem acessada em http://www.imdb.com/title/tt1832368/
[3] Imagem acessada em https://www.youtube.com/watch?v=65VfM6X43Aw 

sábado, 27 de maio de 2017

Cerveja Joaquim: unindo trash metal com bons livros e discos!

Joaquim Session IPA, adquirida na livraria e degustada em casa
Em Curitiba, na região central, bem perto do prédio histórico da UFPR, funciona a simpática e autêntica Joaquim Livros & Discos. Trata-se daqueles espaços que, antes de tudo, é um símbolo de resistência. Em um mundo cada vez mais dominados por vendas online e grandes redes de livrarias, vejo com muito bons olhos os espaços cujos vendedores são, antes de tudo, "livreiros". Fazem questão de conversar com os clientes, conhecem o que estão vendendo, tem conhecimento sobre os autores e também sobre aqueles discos de vinil que estão à venda. 

Foi esse cenário que acabou conquistando Leonardo Barzi. Baixista que trouxe pra Curitiba a Mercy Killing, uma das mais tradicionais bandas de trash metal do Brasil, quando veio de Salvador pra cá no início dos anos 2000,  Leonardo se identificou com esse espaço quando garimpava vinis e tornou-se um assíduo frequentador da Joaquim, chegando a levar a banda para tocar nesse pequeno mas aconchegante espaço (frequentemente a  Joaquim promove shows e bate-papos com artistas dos mais diversos naipes - procurem o canal "Joaquim Apresenta" no Youtube). Pode-se conferir a apresentação do Mercy Killing na Joaquim aqui: https://www.youtube.com/watch?v=vSHhNuzfwhw

Apresentação do Mercy Killing na Joaquim (Leonardo Barzi é o primeiro à esquerda) [1]

Paralelamente, ele, que até então não tomava cerveja, passou a apreciar cada vez mais o vasto universo cervejeiro em Curitiba. Enquanto preparava o disco da Mercy Killing, fez amizades no estúdio com uma galera que estava fazendo cerveja. Foi o impulso que faltava. No final de 2013, sua esposa adquiriu um kit de fabricação baseada em extrato na Bil Bil Beer (loja especializada para quem quer fazer cervejas em Curitiba) e com o tempo e ajuda de seu "guru" Vinícius Brandão, Leonardo passou a mexer com receitas all-grain até chegar a produzir cervas para pessoas de fora. 

Aproveitando-se da relação que tinha com o staff da Joaquim, Léo resolveu disponibilizar algumas de suas cervejas na  livraria para testar a clientela. Primeiro com The Weizen Zone e a Charlie Brown Ale e a Let's Rock Rock Wear (batizadas para celebrar o que ele gostava de assistir na infância). Como deu certo, surgiu a ideia de fazerem uma produção exclusiva, denominada Joaquim, uma Session Ipa, estilo conhecido por ser uma versão de IPA com menor graduação alcóolica, alta drinkability e corpo médio para baixo. Com 5,5% e bastante equilíbrada, achei que a Joaquim (cerveja) bem dentro do estilo, recomendada inclusive para cervejeiros iniciantes. 

Rótulo criado pelo Léo para a Imperial IPA [2]
Interessante que o estilo adotado que atiçou minha curiosidade tenha sido uma Session Ipa, um dos estilo mais leves do universo da Ales, contrastando com o som pesado (e com letras críticas) da Mercy Killing. Mas seu rol de cervas é mais amplo, sendo que até agora já fez, além da Session IPA, 4 receitas de Weizen, 3 de Red Ale, uma Strong Blond Ale e deve engarrafar uma Imperial IPA e outra Robust Porter, que já possuem um rótulo que leva o nome da banda. Léo ainda toca blues e classic rock na Brown Sugar. 

Por fim, percebe-se que cerveja artesanal pode sim harmonizar muito bem com o mais puro trash metal. Que o Léo continue fazendo essa ponte entre o bom e velho rock'n'roll com as as cervejas nacionais em uma livraria das mais autênticas. E espero poder degustar as mais pesadas em breve. 



Notas

[1] Foto acessada em https://www.google.com.br/url?sa=i&rct=j&q=&esrc=s&source=images&cd=&ved=0ahUKEwjm7Y2nxZDUAhUBOJAKHSn_AtAQjhwIBQ&url=https%3A%2F%2Fwww.youtube.com%2Fwatch%3Fv%3DvSHhNuzfwhw&psig=AFQjCNFThTnrEot3NhX0S_f_9dJYcbu8aA&ust=1495990569896333
[2] Imagem divulgada pelo Leonardo Barzi